Não há nada que não se possa contar, até o que não queremos saber e não perguntamos e, não obstante, nos dizem e nós ouvimos.
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)
Não há nada que não se possa contar, até o que não queremos saber e não perguntamos e, não obstante, nos dizem e nós ouvimos.
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)
— Não tens um certo receio? — perguntei-lhe eu.
— Receio de quê?
— Um desconhecido, nunca se sabe. Não quero ser desmancha prazeres, mas, tal como tu própria disseste, no mundo há muitos fulanos com quem nem atravessar a rua se pode.
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)
Embora, no fundo, eu saiba à partida que a única coisa que esse fulano quer é foder-me uma noite e pronto, tal como já se encarregou de me avisar, quer eu queira que ele desapareça, quer não. Quero vê-lo e, ao mesmo tempo, não quero, quero conhecê-lo e que continue a ser um desconhecido, quero que me responda e que a sua resposta nunca chegue. No entanto, se não chegar, entrarei em desespero, ficarei deprimida, convencida de que me viu e não gostou de mim, e isso magoa-nos sempre. Nunca sei o que querer.
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)
Todos estes indivíduos a desiludiram ou abandonaram, com frequência após uma única noite juntos. Em todos esses indivíduos, ela depositou esperanças, em nenhum deixou de ver um projecto, incluindo na primeira noite que tantas vezes prometia ser a última, e cumpria a sua parte. Cada vez lhe é mais difícil segurar quem quer que seja e cada vez se esforça com mais afinco (ainda não lhe chegou, digo eu, a hora da indiferença, nem tão-pouco a do cinismo).
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)
Haverão de sentir saudades destes meses em que faziam alianças contra os demais, contra qualquer pessoa, pequenas troças partilhadas, quero eu dizer, dentro de uns anos as únicas alianças que hão-de ter serão um contra o outro.
—Javier Marías, Coração Tão Branco, Alfaguara, 2021 (1992)